Nos dias tristes, ela não consegue crer
que o sol ainda se põe no mesmo lugar que se punha nos dias felizes.
Quando ela sente a luz do sol,
incessantemente clara e quente, parece impossível que um satélite tão grande não
consiga captar também a tempestade dentro dela a chuva que escorre pelo seu
rosto. É um insulto que não tenha a decência de se esconder atrás de nuvens o mais
rápido possível e, pelo contrário, faz um espetáculo e se retira lentamente,
como um ator apaixonado que hesita em deixar o palco do primeiro teatro que
faz.
E que ironia que o pôr do sol, a
amostra mais óbvia de que tudo continua igual fora do seu peito, seja
justamente o momento em que você decide fazer tudo diferente.
Ela ainda se lembra daquele pôr do sol de
outubro que classificou como o mais bonito que havia visto. Nunca sabia a ordem
das estações do ano, mas achava que era primavera porque haviam tantas flores
amarelas que cada uma delas parecia um pequeno sol que também não tinha a
fineza de não se exibir.
Carlos Drummond de Andrade disse que
nascem sobre nossos túmulos flores amarelas e medrosas. Mas aquelas flores, indecentes e
incandescentes, não tinham medo. Eram as flores mais corajosas e, todas elas,
cansadas de assistir, gritaram, naquele amarelo berrante, que você sempre fora forte
o suficiente para deixar para trás.
Todas as outras coisas gritavam o
mesmo. A terra que entrava debaixo das unhas e a grama que se esgueirava entre
os dedos dos pés. As árvores
que faziam tapetes de sombra e as formigas que subiam pelas pernas. O cor de
rosa e o laranja pintados em aquarela no céu e os cabelos que lhe faziam
cócegas pelos ombros, embalados pelo vento que gritava e esperneava. Diziam que
ela era forte o suficiente para deixar para trás.
As flores não estavam mais lá no outro dia. E não
eram os mesmos grãos de terra que lhe entravam nas unhas e a grama talvez agora
fosse alimento das formigas, e talvez não fossem as mesmas formigas nem as
mesmas cores no céu, talvez não fosse o mesmo vento e talvez alguns fios de
cabelo já tivessem caído.
E, mesmo assim, tudo gritava.
Você é forte o suficiente para deixar
para trás.
"Nos dias tristes, ela não consegue crer que o sol ainda se põe no mesmo lugar que se punha nos dias felizes."
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