Repita comigo: a arte de não repetir

Não sei o que escrever. Na realidade, esta é a décima primeira tentativa de colocar algo no papel. Escrevo. Jogo fora. Escrevo. Jogo fora. Escrevo. Jogo fora. Repetitivo não? É engraçado como notamos a repetição de palavras em um texto, mas não notamos a repetições de ações em nossas vidas. Deixe-me adivinhar, você levantou, tomou seu café apressadamente, pois certamente estava atrasado. Foi para o trabalho/ escola. Sentou-se. Fingiu prestar atenção nas folhas que estavam em sua frente, até porque, mesmo que o conteúdo que preenchem suas linhas é diferente daqueles que preenchiam ontem continua sendo conteúdo e a folha de papel continua sendo de papel  o mesmo papel que todo dia está na porta da sua geladeira contendo a mesma lista de compras que você utilizou no mês passado por mais que  escreveu uma nova lista de compras no mesmo papel com os mesmos produtos que escolhe periodicamente ano após ano e que raramente trocam de lugar na prateleira porque você acostumou-se a frequentar o mesmo supermercado pelo fato de se sentir em casa e por simplesmente temer a mudança e a adrenalina que ela causa. Não, eu não utilizei uma vírgula sequer na oração pelo simples fato de que, assim como a frase, a nossa vida corre. Corre tanto que nosso corpo não consegue acompanhar. Nossa mente não consegue suportar. Chega um momento que a rotina torna-se uma palavra que se repete muitas vezes na redação e que faz perder a organização do texto. Mas, rotina não é organização? Não é ter uma lista de coisas para fazer? Ou uma lista de coisas para olhar? Ou uma lista de coisas para comprar? Mas e uma lista de coisas que quer sentir? Será que a rotina nos permite pensar no que queremos sentir, agora?
Estamos muito ocupados nos tornando pessoas que cronometram cada segundo de suas vidas para chegar em um momento da vida e dizer: Agora sim sou feliz. Acontece que, o ser humano deve ter a consciência que, somos insaciáveis. As férias desse ano, tão esperadas, não valerá a pena se você trabalhar o ano inteiro para elas e nem valorizar seus filhos. 7 dias de convívio não substituíram os outros 358. O seu grande emprego no futuro, a sua vaga na melhor universidade não substituíra a juventude que você, e principalmente eu, perdeu por estar trancado em um quarto enchendo a cabeça com fatos que não terão sentido nenhum amanhã. Assim como nos acostumamos com a rotina, porque não nos acostumaríamos com a ausência dela? Não estou dizendo para abandona-la. Não estou dizendo para jogar tudo para o alto, viver o agora e esquecer o amanhã. O que quero dizer é que não se sinta culpado por estar se ocupando com coisas que lhe faz bem. Não se sinta culpado se não for bem em tudo o que a sociedade lhe impõe. Não se sinta culpado em sonhar acordado. Não se sinta culpado em tirar um tempo para si mesmo. Não se sinta culpado e fazer da felicidade o caminho e não o ponto de chegada. Não se sinta culpado por ser você mesmo. Está vendo quantas vezes eu repeti essa frase? Espero que nem tenha dado importância para isso pois está ocupado demais querendo ser feliz.